Professor da FCS/ Uerj aponta a importância de um Planejamento de Comunicação que seja integrada e estratégica
Por Eduardo Souza
O presidente Lula ordenou que a equipe ministerial evite anunciar medidas que ainda não tenham sido aprovadas, em reunião realizada em 14 de março. O mandatário afirmou que qualquer proposta deveria ser primeiro apresentada à Casa Civil e à Presidência, antes de ser anunciada publicamente. A orientação objetivava impedir que fossem feitas promessas que não pudessem ser cumpridas e arranhar ainda mais a imagem do governo. Segundo a Carta Capital, Lula não especificou quais anúncios lhe desagradaram, preferindo detalhar o assunto em reuniões privadas.
A ordem presidencial foi emitida pouco depois dos erros de comunicação cometidos por nomes importantes da nova administração. Em 13 de março, o ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França (PSB), anunciou o programa Voa, Brasil, que garantiria passagens aéreas a R$ 200 para aposentados, servidores públicos, estudantes e pessoas com renda de até R$ 6,8 mil. Em entrevista à CNN, Márcio França afirmou que o governo federal não subsidiaria o plano, cabendo à Caixa Econômica Federal ou ao Banco do Brasil efetivá-lo.
Outra medida que gerou muita confusão foi a suspensão da isenção tributária sobre compras de até US$ 50 realizadas em sites estrangeiros de comércio online, anunciada em 11 de abril. A determinação era válida somente para transações entre pessoas físicas e, segundo os órgãos oficiais, grandes empresas como Shein e AliExpress se passavam por pessoas físicas para realizarem as vendas sem serem taxadas.
Houve falhas de comunicação e declarações infelizes sobre o teor da medida, que geraram confusão junto à população. Em 13 de abril, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comparou as transações que não pagam impostos a contrabando: “A partir do momento em que o sujeito é receptador de carga roubada e o outro é contrabandista, você vai inviabilizando a concorrência. E isso acaba com o comércio, na prática. Um bom comércio é um comércio em igualdade de condições”. No dia 12 de abril, a primeira dama, Rosângela da Silva, respondeu uma postagem de um perfil de fofoca que noticiava a medida no Twitter, argumentando que a taxação seria sobre as empresas, e não sobre o consumidor. Em 18 de abril, Haddad informou que o governo havia voltado atrás, mantendo a isenção.
Em entrevista à Carta Capital em 14 de abril, Paulo Pimenta, ministro da Secretaria de Comunicação (Secom), admitiu que o governo foi incapaz de explicar a taxação com clareza: “As pessoas têm que se dar conta de que uma declaração sobre um tema no governo geralmente é um tema transversal, que acaba tendo uma repercussão que vai para além de uma área específica. O governo é grande, tem 37 ministérios, tem as suas empresas, e muitos ministros são ex-governadores, outros foram até candidatos a presidente da República… Então, você tem um governo com figuras públicas experientes, fortes, que eram acostumados a dar entrevistas coletivas todos os dias”.
As declarações de Pimenta vão ao encontro das falas de Ricardo Benevides, professor do Departamento de Relações Públicas da Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCS /Uerj). O professor afirmou que as declarações de grandes personalidades influenciam na imagem do governo: “A Janja [Rosângela da Silva], o [Fernando] Haddad, o [Alexandre] Padilha, o Rui Costa têm implicações nisso. Quando eles falam, de alguma forma, a imprensa e a sociedade entendem que é o governo falando e uma eventual declaração torta ou mal compreendida, ou até mesmo a má vontade de setores da imprensa com o governo, pode levar a enganos sobre o que o governo é e quer”.
Benevides também destacou que uma das origens dos problemas de comunicação do governo está na composição pluripartidária e que a Secom deve planejar a comunicação governamental de forma integrada: “A questão é que para vencer a eleição foi preciso fazer uma coalizão com partidos que nem sempre tinham a mesma agenda programática. E a partir do momento em que você começa a governar dentro desse estado de coalizão de grupos muito diversos, é possível ter um desalinhamento da comunicação que compromete a percepção pública sobre o que o governo quer, como ele está agindo. O que a Secom poderia fazer é a construção de um planejamento de comunicação que fosse integrada e estratégica para o governo como um todo. Porque há mais expectativa de ouvir o governo também com outras vozes. Aí está a questão: quem fala o quê? Isso não é simples de fazer e é mais complicado ainda quando se tem personalidades mais fortes, que querem ter uma voz ativa, que querem ter um papel de liderar e de falar”.
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